Saber Ciência / Mário Everaldo de Souza e Susana de Souza Lalic
08/06/2010
Semana passada falamos sobre o funcionamento de uma usina nuclear atual e como é tratado e armazenado o rejeito nuclear. Hoje vamos relembrar inicialmente que uma usina nuclear é uma termoelétrica, só que no lugar do carvão, o combustível que se usa é baseado em urânio-235 (U-235).
Quando um núcleo desse elemento é fissionado (quebrado) libera muita energia que é aquece a água gerando o vapor para girar as turbinas da usina. Assim, o que faz funcionar o gerador (que “cria” a eletricidade) em uma usina nuclear é a energia advinda das fissões que ocorrem no combustível nuclear. Mas então, como é feito esse combustível nuclear? Onde o encontramos?
O urânio (U) é um elemento comum da Terra e é encontrado principalmente na forma de U-238 (99,3%), enquanto o U-235 corresponde a apenas 0,7% (cerca de 1 para 99). O Brasil é rico em urânio, possuindo a sexta maior reserva do mundo, sendo que apenas 30% de nosso território foi prospectado.
Apesar de ambos os tipos de urânio estarem presentes na natureza, a fissão pode ser induzida apenas no U-235 através da absorção de um nêutron, que pode ser fornecido por um emissor de nêutrons. Em cada fissão, o U-235 libera, além de dois elementos menores, cerca de 2 ou 3 nêutrons. Estes nêutrons, por sua vez, causam outras fissões ao se chocarem com outro núcleo de U-235, e assim por diante. Esse processo não é possível com o U-238. Por isso, o combustível nuclear é feito com uma porcentagem de U-235 maior do que a encontrada na natureza.
Para que esse processo de fissão seja mantido adequadamente em uma usina nuclear é preciso cerca de 3 a 3,5% de U-235 em relação ao U-238 (cerca 3 para 97). Tendo em vista que U-235 apresenta uma menor proporção do total de urânio natural, é preciso aumentar sua porcentagem (de 1 p/ 99 para cerca de 3 p/ 97). Esse processo é denominado enriquecimento de urânio. Esse tratamento industrial é tão sofisticado e difícil, que apenas 12 países no mundo sabem como fazê-lo. O Brasil, felizmente, é um deles! Os países que detêm esse conhecimento oferecem empecilhos para que outras nações tenham acesso a elas.
Durante o enriquecimento, aumenta-se, artificialmente, a quantidade de U-235 até a quantidade desejada para o combustível. Esse urânio enriquecido é que forma as pastilhas de 1 cm de diâmetro que são colocadas dentro de varetas no reator nuclear.
Veja que numa bomba nuclear esse enriquecimento deve atingir mais de 90% de U-235, ou seja, quase só U-235 (90 p/ 10), o que não é simples de ser feito, mesmo para aqueles que detêm o conhecimento sobre o enriquecimento. Aliás, o Brasil tem em sua constituição a proibição da produção de arsenal nuclear e, portanto, não pode produzir combustível para uma bomba nuclear.
Resumindo: o Brasil detém o combustível e o conhecimento necessário para a produção segura de energia nuclear. A implantação de uma central nuclear em nosso Estado irá gerar enormes benefícios a população. Durante a construção haverá geração de diversos empregos diretos e indiretos. Mesmo após a construção, durante a operação, com o recolhimento de impostos e as melhorias que devem ser implantadas no entorno da usina, a população sergipana será extremamente beneficiada. Haverá muitos empregos ligados a esse setor que irão gerar renda para a população local. Se não for implantada aqui, será implantada em Estados vizinhos, e com isso não receberemos os benefícios, mas ainda correremos todos os riscos que uma improvável explosão poderia causar.
Pra finalizar, não estamos querendo que se implantem usinas nucleares e sejam deixadas de lado as outras opções, como as energias solar, eólica ou biomassa. Na verdade, precisamos de todas as fontes de energia pra suprir as necessidades de nosso país. Se o Brasil não fizer os investimentos no setor energético agora, nosso futuro será realmente negro, com os apagões que devem ocorrer devido a escassez de energia.
Sem energia elétrica ficaremos estagnados, e isso significa que não teremos energia pra os diversos setores da economia. Isso implica em menos produção industrial, por exemplo, o que tem como consequência menos emprego e renda pra população. Nosso povo tão castigado merece um futuro melhor, e em nossa visão, isso passa pela produção de energia nuclear, inclusive!
Currículo
Mário Everaldo é professor do Departamento de Física da UFS desde 1990, Mário Everaldo de Souza se doutorou em Física em 1990 pela University Of Illinois At Chicago (UIC), Estados com Unidos e possui Especialização em Engenharia Nuclear
Susana de Souza Lalic se doutorou em Física em 2002 pela Universidade de São Paulo (USP). Professora do Departamento de Física da UFS desde 2004, ela tem orientado diversos projetos de mestrado e doutorado na proteção radiológica e energia nuclear.