Marcelo Ennes
Em sua história recente, o Brasil viveu um processo sem precedentes de expansão do sistema público de ensino superior. De acordo com os dados oficiais em 2002 haviam 43 universidades federais no Brasil, este número passou para 45 em 2004, 51 em 2005, 55 em 2008 e 59 em 2010. Portanto, foram criadas no período de 2003 a 2010 dezesseis novas universidades o que representou um aumento de mais de 37% (BRASIL, 2009, p. 10).
Também com base em dados oficiais (idem) além das novas universidades, verifica-se um expressivo crescimento do número de novos campi, em especial em municípios do interior do país. Em 2002, existiam 151 campi universitários de Universidades Federais. Até 2008 foram criados 104 novos campi e havia a previsão da implantação de mais 27. Se considerarmos apenas os campi efetivamente implantados até 2008 houve um crescimento de pouco menos de 69%. Se somarmos o número de campi a serem implantados, esse percentual alcança a casa dos 87%. (idem).
O crescimento do número de universidades federais e campi, como era de se esperar representou um aumento do número de vagas. Em 2002 as instituições de ensino superior ofertavam 1.773.087 vagas, esse número passou para 2.823.942 vagas o que representou um crescimento de 62,80% (BRASIL, 2010).
No entanto, há de se destacar que ao lado da dimensão quantitativa desse processo, existem importantes mudanças qualitativas. Primeiro em razão da interiorização das universidades federais e de seus novos campi. Esse processo tem aproximado de modo concreto e efetivo uma parcela significativa da população que vive nos “interiores” do Brasil. São pequenos municípios, distritos, povoados, vilarejos que passam a ter uma universidade pública em suas proximidades. Esta vizinhança tem garantindo não apenas por aspectos objetivos (como falta de recursos para viagem e/ou manutenção dos estudantes em centros urbanos que até então concentravam quase a totalidade da IFES), mas, também, por questões mais subjetivas, muitas delas associadas a “modos de vida” que dificultam ou mesmo impedem que jovens saiam de seus locais de moradia para viver em grandes centros urbanos.
Além desses aspectos, devemos considerar que este contexto de expansão das universidades federais é, também, composto por outras mudanças, agora, vivenciadas principalmente do âmbito de cada uma das IFES. Talvez a mais importante e significativa tenha sido a implantação e consolidação dos Programas de Políticas Afirmativas. Esses programas fazem parte da grande maioria IFES que tem recebido em suas unidades e cursos de graduação representantes de segmentos da sociedade brasileira que até sua implementação compunham de modo quase residual a universidade pública brasileira, em especial nos cursos mais valorizados socialmente e prestigiados pelo mercado.
Verifica-se, pois, uma mudança de grande importância não apenas em relação aos números de vagas, mas também, em relação aos segmentos sociais que passaram a ter mais acesso à universidade pública no Brasil.
A Universidade Federal de Sergipe também faz parte deste processo. A inauguração do Campus de Lagarto ampliou para três o número de novos campi da UFS. Antes dele, já havia entrado em funcionamento o campus de Laranjeiras, em 2007 e o campus de Itabaiana em Agosto de 2006. Esses novos três campi somam hoje 1130 vagas o que representa no processo de seletivo de 2012, 21,6% das 5490 vagas dos cursos de graduação presenciais da UFS (UFS, 2011).
Verifica-se, no entanto, os primeiros indícios concretos que alertam para a necessidade de corrigir rotas e redefinir estratégias para garantir o caráter democrático da expansão das universidades federais. O contraponto negativo desse processo é o número de alunos que concluem seus cursos dentro do prazo regular. Os dados do Censo da Educação Superior indicam que a chamada “taxa de sucesso” geral dos cursos de graduação ofertados pelas IFES em seu conjunto ficou estacionada na casa dos 26% nestes últimos anos. (BRASIL, 2010). Ou seja há crescimento absoluto, mas não relativo o que coloca questões sobre a saúde financeira e adequação pedagógica deste projeto.
Trata-se de um dado absolutamente preocupante. Primeiro porque os recursos públicos empregados na educação superior são muito elevados, considerando, por exemplo, o PIB per capita do Brasil que em 2011 atingiu a média R$ 19.019 (IBGE, 2011). Segundo dados do MEC (2010) uma vaga na universidade pública custa em média aos cofres da união cerca de R$ 15.000,00. Isto quer dizer que um curso de 50 vagas representa um investimento de aproximadamente R$ 775.000,00. Este é o investimento que os 50 alunos que ocupam as 50 vagas recebem no início de seu curso de graduação o que significa dizer que a união, neste caso, investe R$ 15.500/aluno/ano. No entanto, se a taxa de ocupação das vagas ao final do curso cai, em média, para quase 25%, isto quer dizer que que cada um dos 12,5 alunos que irão se formar passa a receber um investimento de R$ 62.000/ano.
Além desse aspecto financeiro, que não se pode de forma alguma ser ignorado em um pais que ainda apresenta deficiências profundas na qualificação profissional de sua população, devemos atentar para o efeito que esse pequeno número de egressos tem para o desenvolvimento econômico, social, tecnológico e cultural do Brasil. Isto é, com os recursos financeiros, humanos e físicos poderíamos formar um número maior de profissionais (pessoas que passaram e vivenciaram mudanças culturais e nos modos de ver e se relacionar com a sociedade, com o meio ambiente e com as novas tecnologias)o que poderia contribuir para que toda a população brasileira concretize seu direto de ter trabalho e condições de vida dignos.
(Continua)
Referências
BRASIL. Reuni 2008 – Relatório de Primeiro Ano. Brasília, 2009.
BRASIL. Censo da Educação Superior. Brasília, 2010. Disponível em <http://portal.inep.gov.br/web/censo-da-educacao-superior/evolucai-1980-a-2007>. Acesso: 01/08/2011.
MEC. Estudo sobre investimento público em educação em 2008. Brasília, 2010.
UFS. UFS em número 2011/1. São Cristóvão, SE. 2011.
IBGE. Em 2010, varia 7,5%, e fica em R$ 3,675 trilhões. Brasília, 2011. Disponível em: <http://www.ibge.gov.br/home/presidencia/noticias/noticia_visualiza.php?id_noticia=1830&id_pagina=1>. Acesso: 01/08/2011.
Currículo
Doutor em Sociologia. Docente do Departamento de Educação e Diretor do Campus Prof. Alberto Carvalho/UFS/Itabaiana. Docente dos Programas de Mestrado em Sociologia e Desenvolvimento e Meio Ambiente/UFS. m.ennes@uol.comm.br . http://m.ennes.blog.uol.com.br"